segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Síncope

Ainda era primavera, assim como todas as outras dos anos anteriores. Para ele, o marasmo era o mesmo. Chegava ao ponto de não perceber mais a diferença entre os dias e as noites. A rotina o absorvera e consumia seus intantes como ondas em grãos de areia. O estorvo da vida o transformara em um cego encalabouçado. Marionete do cotidiano. Já não via vida na vida, pois não conseguia mais dominar os fios que o conduziam. Estava prestes a entregar os pontos e desfazer os pontos. Olhar ao lado era custoso. Sentir era improvável. Entretanto, num insight (duvidoso) percebeu que restava esperança, que muito de sua vida poderia esperançar-se naquele átimo. Piscou, e tudo havia se cintilado, contudo a vida ainda o exasperava. Tinha medo. Era prudente e não se entregava. Menos naquele milésimo de segundo transformado em eternidade. Deixou-se afagar e dedicou-se a cada parte de todas aquelas horas. No beijo, o tempo estagnou-se, esquecera-se de todos os contratempos. Fizeram-se únicos naquela partícula.
Essa paralisia imininentemente volátil durou muitas horas subseqüentes, mas por ser impendente voltou-se à realidade, o que não anulou o tão supremo momento. Guardaram-se em suas histórias.

Ela, enquanto caminhava em pensamentos e devaneiava sobre o sublime e pequenissímo espaço de tempo, colocou-o no mais alto patamar de seus amores, redomou-o para que jamais se dissipasse. A magia estava salva.

Ele, ainda atordoado com as desafetações da vida, não conseguia respirar, estava, sim, em estado de encantamento, mas estonteado, confuso, inquieto. Muita coisa mudara e o passado o assombrava.
A cegueira continha-se e as portas da masmorra abriam-se; havia luz, distante, mas luz. O sorriso já aparecia no canto dos macios e encantados lábios. Havia esperança dentro do esfacelamento existencial.
Substanciou-se a vida, mesmo que num lacônico momento.